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Entrevista com Henry Kono Sensei


Henry Kono
Henry Kono

Henry Kono, 75, é o único aikidoista canadense a ter treinado com o Fundador do Aikido Morihei Ueshiba. Nascido em Vancouver, no Estado de British Columbia (BC), em 24 de agosto de 1927. Como nissei (segunda geração de canadense descendente de japoneses), ele, duas irmãs, um irmão e os pais foram detidos em um campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial.


Após a guerra, a família restabeleceu-se em Toronto. Henry foi ao Japão em 1964 para visitar as famílias de seus pais (originários de Shikoku). Tornar-se um aikidoista foi por acaso. Após visitar a família no Japão, ainda tinha tempo e resolveu visitar o Hombu dojo, em Tóquio, onde O-Sensei estava ensinando. Ele havia lido a respeito de um artista marcial fenomenal e queria ver se era verdade. E era. Henry ficou quatro anos treinando no Hombu dojo.


Retornou a Toronto, Ontário, quatro anos mais tarde, onde trabalhou como ator em propagandas, até sua aposentadoria. Também dá aulas e seminários no Canadá, EUA e Europa. Tem um filho.


Quando me dirigi a ele pela primeira vez, o chamei "Sensei Kono" ("sensei" termo comumente usado no Japão em sinal de respeito a todos os professores). Ele insistiu em que o chamasse "Henry". Com meu primeiro professor de aikido, de Nelson ‚ BC, Jean Rene Leduc, foi da mesma forma. Encontrei-o em sua casa no leste de Toronto, em 3 de janeiro de 2003.


Ele é uma pessoa amigável e realista. Entre xícaras e xícaras de chá verde e tigelas de biscoitos de arroz, nós conversamos em sua cozinha durante a tarde.


O que você está fazendo atualmente?

Não muito. às vezes ainda ensino.


Está ensinando na Irlanda?

Vou à Irlanda porque tenho um amigo, Alan Ruddock (anos 50), que estava no Japão comigo naquela época. Não nos correspondemos por cerca de 30 anos. Ele seguiu seu caminho. Há aproximadamente sete ou oito anos, ele me escreveu e disse: "Ouvi dizer que você ainda está vivo! Você quer vir para cá?" Foi então que comecei a ir à Irlanda. Gosto do país.

O modo como o aikido de Alan evoluiu, desde a ™ltima vez que o vi no Japão, me deixou estupefato. Durante toda uma hora, enquanto ele ensinava, sentei hipnotizado pelo modo como ele mudou e improvisou o punhado de movimentos, com que ambos deixamos o Japão.

Eu realmente não fui ao Japão estudar aikido. Fui para visitar meus parentes. Minha mãe veio de uma família de onze pessoas e meu pai tinha um irmão e uma irmã. Eu queria ir e vê-los. Em 1964 fui ao Japão. Durante um mês, visitei todos os meus parentes, uma semana aqui, outra semana ali. Eu tinha um Visa de seis meses, assim, quando retornei a Tóquio, ainda tinha cinco meses para gastar. Tóquio é realmente uma cidade estressante. Você não consegue ficar lá sem fazer nada. Ouvira falar do aikido, assim, decidi conferir. No dia que fui, era por volta duas horas da tarde, Bob Nadeau estava fazendo rolamentos no tatame. Eu disse: "o que preciso fazer para me matricular?" Permaneci por quatro anos.


Você já havia praticado artes marciais antes?

Nunca havia praticado qualquer arte marcial. Havia alguns artigos no jornal "New Canadian" (um jornal nipo-canadense, agora extinto) sobre esse fantástico senhor chamado Ueshiba, que derrubava vários homens ao seu redor sem sequer tocá-los. Havia também um pequeno livro de Jay Gluck, Combate Zen, e nele havia um artigo sobre O-Sensei. Isso era tudo que eu sabia antes de chegar ao Japão.


Ser detido durante a Segunda Guerra Mundial em um campo de concentração, em virtude de ser nipo-canadense, teve algum efeito em seu modo de pensar?

Não. Para mim, a detenção em Slocan - BC, foi uma época excitante. Vi um país novo, um lugar diferente. Minha mãe não tinha uma atitude negativa sobre isso. Ela dizia: "Em tempos de guerra esse é o tipo de coisa que acontece. Nós devemos agradecer às nossas estrelas da sorte, que possamos estar todos juntos." Ninguém estava sendo torturado ou interrogado.


Qual era sua idade em 1964?

Eu tinha quase 37 anos. Apesar de ter parentes em Tóquio, tinha meu próprio lugar para morar. Naquela época, viver no Japão era muito barato. Se economizasse meu dinheiro, podia viver com $100 por mês. Os outros estudantes estrangeiros ensinavam inglês para ganhar dinheiro, mas eu sentia que os japoneses não gostavam de receber aulas de um japonês. Se eu pudesse dizer algo, mas eles não podiam, eles se sentiam bem mais autoconfiantes. Tentei ensinar por um tempo, mas foi um fiasco, assim me concentrei em meus próprios problemas com o idioma.


Onde Alan está morando?

Ele mora na "Ilha do Homem", mas seus pais moram em Dublin. Quando ele voltou para casa, foi para o colégio de professores em Londres e terminou na "Ilha do Homem". Ensinou ali, assim como na Irlanda. A cada verão realizamos um seminário de uma semana, em Galway.


Como È o aikido na Irlanda?

A Irlanda é notável. é o aikido mais amistoso que jamais vi. Na Irlanda, tudo é aberto e amigável. Tenho encontrado pessoas que vêm de outras partes do país e me dizem que foi o seminário mais encantador que já haviam assistido.


E a respeito da afiliação do dojo?

Na Europa, há muitos dojos independentes e aqueles afiliados ao Hombu.


O que o manteve no Hombu por quatro anos?

Era o que o Sr. Ueshiba estava fazendo. O que ele estava fazendo? Esse é o mistério de O-Sensei. Para mim, ele era um mágico. Não me entenda mal, ele era um gênio. Tenho o mais profundo respeito por ele. Se nunca o tivesse visto, não teria aprendido o que aprendi. Nunca! Se praticasse cem anos no Canadá, nunca teria conseguido esse aprendizado. Foi somente porque o vi, que aprendi o que aprendi. Se olharmos a história japonesa, o Japão lutou com espadas por cerca de 1200 anos. Talvez tenha havido, de fato, por volta de quinze grandes espadachins. Um a cada século. E ele foi um desses. Ele foi o último. Não vamos mais ter alguém como ele, porque a sociedade e os tempos atuais não buscam esse tipo de pessoa. Agora, eles têm que aprender sobre os computadores! Qualquer um desses mestres japoneses que descobriram a verdade, nunca disseram o que ela era. Todos levaram esse conhecimento para o túmulo e O-Sensei não foi diferente nesse aspecto.


Você tem estado praticando por um longo tempo.

Praticar não significa nada. O que O-Sensei pensava é o importante. Ele baseava seus movimentos numa matriz invisível, que não conseguimos compreender. Todos pensavam que ele podia fazer essas coisas porque tinha 65 anos de prática. Eu não via dessa forma. Para mim, o que ele sabia era o importante. Nem todos procuraram enxergar dessa forma.


[Henry me mostra uma citação de Sensei Sugano, que diz: "Era como se O-Sensei estivesse fazendo aikido, enquanto os demais estavam fazendo outra coisa qualquer."]


Então o que nós estávamos fazendo? O que estávamos fazendo no tatame não era o que ele estava fazendo.


Mostrando-me outra citação de um artigo de Bob Nadeau, na revista "Aikido Today", que diz: "Certa vez O-Sensei me disse, clara e enfaticamente, que a verdade do aikido podia ser captada em um curtíssimo espaço de tempo. Se você descobre o segredo," dizia ele, "você pode fazer o que faço em três meses."


É isso o que eu estava procurando. é aí onde eu tinha vantagem. Eu falava o idioma. Eu não lia ou escrevia em japonês, mas conversava, e os faixas pretas me ajudaram durante todo o tempo que trabalhei com eles. Mas para aqueles que não falavam o japonês, a troca de idéias foi muito limitada. E mesmo para quem falava japonês, demorava em torno de três anos para entender o que eles realmente tentavam transmitir para você. Após cerca de três anos e meio é que começou a ficar claro para mim. Isso requer paciência e persistência.

O-Sensei nunca deu aulas propriamente, porque estava com 82 anos na época em que cheguei. Quando ele aparecia e fazia essas coisas, era uma experiência mística que você estava vendo.


Com que frequência você via O-Sensei?

Se estivesse nos fundos do dojo, ele podia aparecer todo dia. Mas se estivesse fora, podia passar três semanas sem vê-lo. Se estivesse ali, podia aparecer por cinco ou dez minutos e então entrava. Eu o vi cerca de 300 vezes durante os quatro anos. Ele nunca explicava o que fazia, apenas executava! é isso que quero dizer por ser mágico. Ele executava o movimento e se você não conseguisse discernir o que ele fizera, não havia maneira de imaginar isso. Ele nunca explicava nada, mas deixava dicas que eram muito difíceis de discernir, pela maneira como ele exprimia suas idéias em frases curtíssimas, que ninguém conseguia entender.

Assisti uma fita de Sensei Shioda sendo entrevistado na Inglaterra. Ele esteve com O-Sensei por dez anos, entre 1930 e 1940, ele disse que O-Sensei, naqueles dez anos, nunca explicou sobre o que estava fazendo.

Ele não era um professor no sentido de estar ensinando. Para o japonês pode parecer que é estar ensinando, mas para o ocidental isso não é ensinar. Você precisa intuir o que ele está fazendo e dizendo, ler nas entrelinhas por assim dizer.


Você treinava todos os dias?

Todos os dias. Eu costumava ir a aula de 8 às 9 da manhã. Devido ao ritmo muito acelerado, dava para fazer apenas uma aula por dia. Estava em meus trinta e tantos anos e meu corpo não se recuperava tão rápido. Também diziam: "Uma hora por dia é o suficiente, mas venha todos os dias." Para mim a aula de 8 às 9 era a ideal, pois havia muitos estrangeiros, aproximadamente uma dúzia. E a parte boa era no dojo, que eu podia falar em inglês!


Com quem o você treinava?

Bob Nadeau, Bob Frager, Virginia Mayhew, Terry Dobson, Ken Cottier e Norm Miles, que ainda está morando no Japão. Havia alguns da Alemanhã, França e Inglaterra.


Outros canadenses?

Nenhum. Havia alguns japoneses dos Estados Unidos: Joanne Shimamoto, que casou-se com Akira Tohei em Chicago, e outro rapaz que está ensinando na Carolina do Norte, Roy Suenaka, e um outro da Califórnia.


Você treinava em algum outro horário?

Ocasionalmente eu ia ýs aulas noturnas, mas eram muito lotadas! Era como treinar num bonde lotado!


Qual sua lembrança dos treinos daquela época?

Era realmente um tempo agradável. Nós podíamos brincar, podíamos conversar no tatame, bater papo, rir e ninguém dizia nada. Ouvi dizer que agora está tudo mudado. Antes de Terry Dobson morrer, ele me disse: "Henry estivemos lá nos melhores dias!" Todos nós estrangeiros nos sentíamos muito solitários. Nos mantínhamos todos unidos.


Que tipo de comunidade estrangeira havia lá?

Todos nós vivíamos individualmente. A única comunidade era no dojo. Muitos ensinavam inglês, de outra forma não tinham como se sustentar. Acho que eu era o único que não trabalhava.


O que você fazia, então, com tanto tempo livre?

Essencialmente, tentava melhorar meu japonês para falar com mais desenvoltura.


Você voltou mais alguma vez ao Japão?

Não. Eu vi o que queria ver, consegui o que queria. Então, nunca mais voltei


Você ensinou aikido quando retornou para Toronto?

Ensinei em um centro comunitário, que fica atrás da Galeria de Arte de Ontário, onde prestam serviços comunitários e assistência social. Alguém estava ensinando ali e quando souberam que eu havia voltado, me perguntaram se ainda queria continuar as aulas. Dei aulas por quase 20 anos. Trabalhava durante dia e dava aulas como uma atividade de meio período.


O que O-Sensei dizia sobre o Yin-Yang?

Ele nunca falou muito a esse respeito. Mas estudou sobre o assunto em Omoto-kyo, a religião era principal interessada no que o Shinto acredita, mais ou menos. Sobre o Shinto, mesmo no Japão, eles também não revelam tudo aos japoneses. Eles apenas ensinam "o suficiente", um pouco de cada vez. Grande parte do conhecimento eles ainda detêm para si próprios, assim, mesmo os japoneses não sabem muito sobre esse assunto! Se você perguntar a um japonês, "O que é o Ki?" Eles não sabem responder precisamente. Eles também se confundem!


O que O-Sensei dizia sobre o "ki"?

Você não conseguia discutir sobre esses assuntos, porque ele não ia falar a respeito disso com você. Ele dizia algo e você compreendia, ou não. Era assim! Você não dizia: "Sensei o que o Sr. quer dizer?" Isso você não conseguia fazer!


Mas O-Sensei mencionou o Yin-Yang para você, numa festa de aniversário para ele...

Essa foi a ™nica vez. Para mim, aquela foi a Pedra de Roseta. é preciso inserir isso no contexto para compreender esse fato.


Como isso mudou seu pensamento sobre o aikido?

Naquela época, eu não sabia o suficiente sobre o assunto. Eu estava lá havia cerca de um ano e perguntei às pessoas sobre "yin e yang" e sobre como isso se aplica ao aikido e ninguém era capaz de entender! Apenas me diziam para "treinar!" Eu também pensava que se treinasse como um louco iria conseguir entender.


Mas a prática não é o segredo?

Não. Você precisa aprender a treinar inteligentemente.


O que È "treinar inteligentemente"?

Ter o conhecimento do yin e yang, isso é inteligente. O-Sensei saiu de Omoto-kyo, trazendo todo esse conhecimento, ele aplicou esse conhecimento ao que estava fazendo; eis porque suas técnicas estavam se desenvolvendo. Mesmo após a guerra elas continuaram se desenvolvendo.


Então o aikido é um processo evolutivo?

Correto. Os estudantes estrangeiros entenderam isso bem melhor do que os japoneses.


Como era seu treinamento no Japão?

Após quatro anos ao retornar a Toronto, acho que eu sabia não mais do que 20 técnicas! Esse era o modo como se fazia no Japão. Nós treinávamos ikkyo, nikyo, sankyo, yonkyo, como movimentos básicos, além de alguns outros. No ano seguinte, você repetia de novo e de novo. Era assim. Agora você precisa de 600 técnicas para ter um sho-dan, certo? A infelicidade sobre isso, é que fazendo assim, muitas técnicas, estamos matando o aikido, porque está tudo automatizado em seu cérebro, assim nada se desenvolve de você. Por que precisa ser espont’neo com alguém se você está programado no que fazer?


Sem o yin e yang torna-se difícil aprofundar isso. O ataque é yang, mas você se torna yang também e você está forçando o uke para o yin. é por isso que há tantos machucados. Estive no Hombu dojo por quatro anos e durante esse tempo vi somente uma clavícula quebrada. Foi um novato que rolou de maneira errada, mas era assim. Ninguém mais feriu-se no Hombu. O-Sensei era extremamente exigente quanto aos cuidados que devíamos ter com os outros. Ninguém queria ser o alvo da raiva de O-Sensei. Ele sentava você e o repreendia por cerca de meia hora.


E sobre as regras no dojo?

Era bem à vontade. Os faixas pretas podiam sentar em qualquer lugar. Mas hoje, todos ficam separados. Minha opinião é que o clima era muito espont’neo. Mesmo quando estávamos treinando podíamos conversar uns com os outros.


O-Sensei não ficava bravo por conta disso?

Não.


Qual sua opinião sobre o "hara"?

Sou contra o hara, (lit. "estômago" ou "abdome") pois acho que está sendo muito específico. Sinto que tudo poderia evoluir em conjunto ‚ hara, movimentos, ganhar força e conhecimento. Quando você e eu estamos trabalhando juntos, esse (hara) não é o centro. Para muitos aikidoistas, o centro vai descendo desde a parte superior da cabeça até o chão, o que é correto se você está sozinho. Não estou dizendo que o centro não existe. Mas quando estamos juntos, como pode esse ser o centro "ativo"? Esse "centro" ser o ponto central entre você e eu. Se você é um carpinteiro, você pode determinar o ponto central de uma peça de madeira, mas se você pregar a madeira, não poderá insistir em dizer que esse ponto central original ainda é o centro "ativo".


O que O-Sensei dizia sobre o centro?

Ele não discorria sobre esse assunto. Ele apenas demonstrava com o uke e nesse movimento tudo estava contido.


Qual origem desse conceito?

Ao olhar para o símbolo do yin e yang, vai depender da perspectiva com que você está lidando. Se você isolar o lado preto ou o branco, pode dizer que eles têm seu próprio centro, o que é óbvio. Mas quando se unem como um símbolo, o centro é representado no ponto em que cada lado se junta. Não há outro lugar onde o centro possa estar, senão onde eles se encontram, ambos os lados sendo idênticos em valor e peso. Não precisa pensar. é pura matemática.


O aikido convencional não é a mesma coisa?

Não. A maioria abaixa para desequilibrar a outra parte. No yin e yang, ninguém está tentando desequilibrar ou mesmo controlar alguém; pode-se tão somente mover-se em conjunto.


Então como derrubar alguém?

Movimento. é isso que você sentia quando O-Sensei aplicava uma técnica. Quando ele executava o movimento você não sabia como tinha caído. Ele estava segurando você ou você estava agarrando nele, mas você não sentia qualquer força quando ele executava o movimento. Você caía. Não se pode dizer eu me joguei. Mas como ele fazia, ninguém tinha como explicar! Quando qualquer outra pessoa executava a técnica, você sentia que estavam executando o movimento em você, a pessoa lhe desequilibrava não importasse quão leve fosse o movimento. Quando O-Sensei fazia, "bang" você caía. Por que você caiu? Você não conseguia explicar.


O que você acha da evolução técnica do aikido de hoje?

Sinto que as pessoas estão tentando ser muito precisas. Não importa o quanto se pratique uma técnica, duas pessoas não conseguirão executá-la da mesma forma. Tanta expressão para descobrir o modo dele ou dela fazer o movimento, para encaixar o corpo em um dado movimento, deveria ser deixado mais à vontade do indivíduo.


Anteriormente você mencionou que o "uke" é um grande problema para o aikido de hoje. Você pode explicar?

A menos que você esteja em base, não conseguirá aprender essa arte. O yin e yang acontecem o tempo todo, em todos os lugares. Se você não é flexível ou atencioso o bastante, não pode avaliar o outro lado se estiver muito tenso.


O que você acha sobre o "ki"?

O ki é um equilíbrio de energias que fluem em direções opostas em uníssono. Se uma quantidade de energia vai em uma direção, há outra que vem em sentido contrário, na mesma intensidade. Nada neste universo existe sem o princípio do yin e yang. Yin não é dizer: "Vou desequilibrar o yang", ou vice-versa; ele simplesmente se move em conjunto! é isso. Fazer alguém entrar ou destruir a outra metade é uma impossibilidade! E se uma dessas energias desaparecesse, não estaríamos aqui sobre a terra, porque são necessárias duas energias para manifestar este universo físico.


Qual sua opinião sobre o treinamento nos dias de hoje?

é muito pesado. As pessoas deveriam tentar treinar mais naturalmente como se não estivessem tentando obter resultados. Mas a idéia das pessoas é conseguir algo desde o começo. Nós nunca treinamos dessa forma. Deve-se aprender a treinar como se você não estivesse fazendo nada. As pessoas estão sempre treinando para "fazer" algo. Por isso a coisa toda está tão esquisita. Sempre senti que fazia algo para acabar com essa carga desnecessária que carregamos conosco.


E a respeito dos professores?

Não acho que sabem o suficiente sobre o uke. Não sabem o suficiente para ensiná-lo. Não ensinam o uke no todo. Quando estava no Japão era uke, uke, uke!


De que maneira era sua relação pessoal com O-Sensei?

Quando ele costumava dizer: "Não vou dizer a vocês o que vou fazer!" Eu costumava sussurar em voz baixa, "antes de voltar para casa, eu vou entender sua mente." Eu e ele tínhamos um jogo em andamento.


Voltando ao uke...

No Hombu dojo, o professor que estivesse dando aula nunca falava sobre uke. Era sempre a pessoa com a qual você estava treinando que lhe falava. No Japão, não é como aqui, onde 80% são faixas brancas, lá, 90% são faixas pretas. Se você estiver treinando com a pessoa certa, ela lhe dirá. Quedas são uma necessidade de auto-preservação, porque se você não souber cair, você vai se machucar.


Ela é importante, porque é metade de qualquer movimento do aikido. O pensamento deles era, se você compreender a metade do uke, a outra metade é fácil de compreender. Agora, sinto que nos concentramos em derrubar e ignoramos totalmente o aspecto do uke.


Como ensinar um bom uke?

Você deve fazer isso naturalmente. Os estudantes têm que aceitar que precisam aprender o uke. Se estiverem com a mente convencida de que estão ali para derrubar, eles vão se fingir de surdos, quando o assunto uke vier à tona. Ele é a metade do todo. Derrubar é a parte fácil. é o uke que é a difícil. Você precisa de muita conversa, para conseguir o entendimento de alguém que sabe sobre esse assunto.


Como isso muda nosso entendimento do aikido?

Porque podemos sentir o movimento. Você está receptivo. Quando tentamos fazer o movimento, não podemos vê-lo. Quando apenas recebemos o uke, podemos ver o movimento. Essa é a maneira de aprender. Todos têm a idéia de que não se aprende nada do uke. E é por isso que eles não treinam o uke. Nós nunca fomos ensinados dessa forma.


Então, nos seus primeiros três anos no aikido você foi somente uke?

Essa era a idéia. Eu costumava perguntar: "Tenho estado fazendo isso por um ano e não sei que diabos estou fazendo." Eles diziam: "Não se preocupe Kono-san. Apenas seja uke! Você entenderá." Era importante desenvolver esta sensibilidade e mobilidade do corpo.


Sensibilidade È importante...

Porque estou aprendendo exatamente o que você está fazendo. Você está verdadeiramente se tornando yin. Você deve ser flexível. Então, o centro começa a se desenvolver. Essa é a única maneira de desenvolvê-lo.


Qual seu conselho aos iniciantes?

Eu apenas digo libere sua energia. Você não vai aprender tudo em seis ou sete meses, assim, deixe fluir. Apenas faça os movimentos como se você estivesse se divertindo. Se eu for um bom uke e você não conseguir executar a técnica, irei até você e assim você poderá fazer aquela técnica. Aqui é mais uma questão de alcançar aquele músculo que te deixa rígido. Tenho visto professores, que esperam que iniciantes façam uma determinada técnica após três semanas. No Japão eles não fazem isso. Pode-se levar quatro anos e até mais tempo.


Visitando sua página na internet, me interessou sua idéia de "atenção". Você pode explicar?

é tudo uma questão de equilíbrio, se ela é yin e yang. é como quando você está dirigindo: você tem que olhar a linha central e permanecer em seu lado da pista; é pelo conhecimento de onde está seu lado e a linha central que você identifica o centro da pista. A fim de ter equilíbrio, se requer atenção para permanecer centrado.


Como se ensina isso?

Tenho que falar aos estudantes primeiro. Deve-se entender o que é o equilíbrio. Se você não entende que precisa manter esse e aquele lado equilibrados; não há razão para mantê-lo ali. é importante que você entenda o que o "equilíbrio" verdadeiramente significa. Quando isso é entendido, você irá mudar o movimento do seu corpo para manter-se em uma posição de equilíbrio, à medida que a situação muda no movimento.

Estamos tentando aprender o que é a energia natural equilibrada, como no yin e yang, assim, você deve se tornar receptivo e ter o desejo de aprender o que isso pode ser. O que se requer é uma mente aberta ‚ uma pessoa não aprisionada por seus próprios pensamentos.


Como O-Sensei fazia então?

Ele apenas fluía com você. Se você o atacasse ele fluía com você. Sei que esse é um conceito difícil de entender. Ele é tão simples que as pessoas não o aceitam.


Como podemos entender melhor o "equilíbrio"?

Temos que falar sobre ele. Esse é seu próprio auto-estudo. Se entro num dojo e começo falando de equilíbrio, vão pensar que é algo sem sentido. Todos querem aprender técnica. Se não querem saber sobre equilíbrio, então fica difícil transmitir o conceito, e a idéia de yin e yang, torna-se de difícil compreensão.


O Sr. está dizendo que a prioridade da técnica sobre o equilíbrio é errada?

Correto. A prioridade é o equilíbrio. Deve-se combinar a técnica com o equilíbrio, porque se não estão estudando o equilíbrio, estão apenas estudando técnicas. Você deve estudar algo de valor!


Quando estamos em equilíbrio, porque não precisamos conhecer a técnica?

Porque quando você se move, a técnica flui do movimento em equilíbrio.


Isso não é desequilíbrio?

Não há desequilíbrio no yin e yang. Se você permanece centrado tudo sai correto. Todas essas coisas sobre respiração, koshi (quadris), você não deve se preocupar com isso, elas se encaixam por si mesmas como um todo.

Essa é uma arte de conhecimento, não de raciocínio. Você aprende através do equilíbrio, mantendo este lado e aquele lado iguais. A prática não lhe dá isso, se você não tiver esse equilíbrio em mente.


O que a palavra "sensei" significa para você?

Para mim "sensei" é alguém que compartilha o que sabe com os outros. Sinto que, passando o que sei, estou honrando a todos aqueles que me ajudaram a estar onde estou hoje. Todos aqueles com quem tive contato, moldaram meu estilo e pensamento, para me dar o ponto de vista que tenho hoje; assim, quando compartilho esse conhecimento, eles também estão dando o que tinham, a cada um e a todos, a quem tenho o privilégio de ensinar. Um bom "sensei" é alguém que ensina os outros a serem melhores "senseis" do que ele próprio.


Henry, muito obrigado, por me conceder esta entrevista.


Entrevistador: Norm Ibuki

Traduzido por: JosÈ Antonio Sousa

Fonte: Aikido Journal


Apoio:

Aikido - Instituto União


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